17 de set. de 2012

gay demais?!


Este texto foi publicado originalmente no blog Mãe, eu sou gay, escrito pela mãe de um rapaz homossexual, mas chegou aqui pelo Tales Tagliaferri.


O atual sistema de proteção racial que temos no nosso país, que se não é perfeito tornou-se um passo importante no resgate de uma dívida histórica com uma parcela explorada de nosso povo, não nasceu do nada. A Lei Caó, a transformação de racismo em crime inafiançável, as cotas em universidades e o resgate da cultura negra e africana nesse país são frutos de um movimento organizado. São consequência de um movimento, lá nos anos 80 de resgate do orgulho de ser negro, do orgulho das tradições legadas ao país, de uma identidade de COMUNIDADE, que unida é mais forte que separada. E que foi as ruas exigir isso. Não apenas em passeatas ou protestos, mas numa revolução silenciosa e diária. No assumir características raciais marcantes, como penteados afro, ou usar roupas com cores da África, movimentos culturais e de arte e se posicionando enquanto grupo consumidor, que exigiu produtos e serviços voltados a sua especificidade.

Ninguém, nenhum órgão ou político, vai legislar para um grupo invisível. Diferente de negros, que não podem fingir ser brancos para serem aceitos, gays tem essa possibilidade. Podem se "heterossexualizar" senão assumindo uma vida hétero, mimetizando essa vida num discurso que fala em ser discreto para ser aceito. Heteronormatizar o movimento gay tem sido um discurso recorrente dentro da própria comunidade. Ele aparece quando se diz que não é preciso beijar na rua e ofender ninguém. Ou quando se defende que não é preciso esfregar a sexualidade na cara de ninguém. Aparece no desprezo aos afeminados que sujam a imagem sendo gays demais. Vem embutida nesse discurso discreto que prega que você desapareça na multidão e passe a ser parte da paisagem. Agindo e pautando sua vida por regras da sociedade heteronormativa.

O que muitos não percebem é que ao fazer isso, se reproduz dentro da comunidade gay, um padrão machista da sociedade. Que diz que o feminino (ou afeminado) é inferior, menos importante. Que despreza o passivo como menos macho e mais gay que o ativo. Que cria castas onde, quanto mais heterossexualizado eu parecer, melhor. Seja gay, mas suma na multidão hétero sem que ninguém perceba que você gosta mesmo é de trepar com alguém do seu sexo! Só que é ISSO QUE INCOMODA ELES. E é isso, trepar com alguém do mesmo sexo, a ÚNICA coisa que TODOS os gays tem em comum. Não importa se você é macho alpha, barbie, bombadão, travesti, afeminado, bicha louca...invente o termo que você quiser. No fim, a única coisa que importa para homofóbicos é que você trepa com alguém do seu sexo!

Ah, eles podem fingir aceitar você. Desde que você aceite uma troca. Eu finjo que não me importo que você dorme com alguém do mesmo sexo e você faz o favor de restringir sua vida afetiva e emocional as quatro paredes da sua casa. Longe dos olhos da sociedade civilizada. Você finge que está tudo bem e eu vou fingir que não acho você uma aberração que deve ficar longe dos olhos dos bons cidadãos Sacou? Essa é a troca que você está fazendo!

Não. Você não precisa ser fã de Madonna e falar gírias para ser gay de verdade. Mas alguns falam. E alguns são afeminados. E eles NUNCA vão sumir na multidão. E eles estão no mesmo barco que você! Eles não são os inimigos. Eles não estão sujando a imagem da comunidade gay. Eles são TÃO GAYS COMO VOCÊ. Sem tirar nem pôr. Quem faz o que na cama não devia importar a ninguém, além dos dois envolvidos. E nem determina quem é mais gay.

Protestos, sites, paradas e afins são super necessários. Importantes e fundamentais para que possamos conseguir legislação adequada. Mas você quer fazer uma revolução hoje? Então seja gay. Não apenas dentro da sua casa, escondido nas boates ou atrás de portas fechadas. Mas seja você. Homem ou mulher, profissional, filho, amigo, jornalista, professor, afeminado ou não, masculinizada ou não, GAY. Na vida, como na cama. Por que só assim é possível sair da invisibilidade e dizer em alto e bom som: Eu existo. Viva com isso!

(E esse tanto de amigos cercando esses garotos? Podem me chamar de utópica, 
mas eu SEI que tudo vai melhorar. #ItGetsBetter)

* * *

"Essa é um pouco da minha história. Com isso, quero mostrar a quem possa achar-se em condições insustentáveis, a quem possa achar que suas dificuldades são impeditivas para prosseguir, que nada no mundo é impossível quando você é uma pessoa que possui retidão, que não luta pela destruição dos outros, que levanta-se da sua cama e dá sua cara para bater e mais do que tudo: ousa ser quem você é, mesmo morrendo de medo dos ataques. Só que, também sei que o medo é um demônio, e eu não acredito em demônios." ("Eu sou mais do que você pode ver", na íntegra aqui)

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