6 de fev. de 2013

ainda sobre o pastor e o geneticista: é a cultura, ...!


Do comentário de Leandro Colling no iBahia (vale a pena ler na íntegra aqui) a respeito do celeuma em torno da entrevista de Malafaia e da resposta do geneticista Eli Vieira:

(...) 1. Essa entrevista do Malafaia com Marília Gabriela e o vídeo do geneticista encobrem uma outra questão fundamental: por que a sociedade e os ditos cientistas querem tanto saber sobre o origem da homossexualidade e não querem saber da origem da heterossexualidade? Qual são os objetivos dessas pesquisas que tentam encontrar um gene gay? Para curar a homossexualidade? Se, por acaso, a ciência chegar a encontrar os componentes genéticos que geram a orientação sexual homossexual, com esse movimento fundamentalista que avança no Brasil e no mundo, vocês têm dúvida de que eles não financiariam a possibilidade de que homossexuais não pudessem mais ser gerados? Então, alô militantes LGBT, vejam que grande tiro no pé, hipoteticamente, vocês podem estar cometendo ao se filiar a esses argumentos!

2. O que nós precisamos é de argumentos que se diferenciam dos fundamentalistas e não que eles nos pautem em suas falas que apenas produzem ódio. No fundo, tanto Malafaia quanto o geneticista querem defender que existe um padrão de “normalidade” sobre as orientações sexuais. Malafaia diz que a heterossexualidade é normal e o geneticista diz que a homossexualidade também é normal, uma vez possui algum componente genético. Enquanto isso, nós temos evidências suficientes para mostrar o quanto a sociedade em geral, e os fundamentalistas em particular, defendem com unhas e dentes uma “pedagogia da heterossexualidade”, como diz a nossa querida Guacira Lopes Louro em seus textos. Escrevi sobre isso em Por que a heterossexualidade não é natural?

3. Além disso, esse “debate” joga novamente para o escanteio toda a discussão sobre a produção das identidades. Até quando vamos reduzir a sexualidade, seja ela a homossexualidade ou a heterossexualidade, à prática sexual entre as pessoas e/ou à “biologia”? Nós sabemos muito bem que a prática sexual é uma questão importante (para os fundamentalistas apenas se for para a reprodução), mas que as nossas sexualidades e nossos gêneros são compostos por diversos outros fatores. A imensidão e riqueza desses outros fatores ficam obscurecidos nesses debates que envolvem as chamadas “ciências duras”, como a genética e a neurociência. O que precisamos é discutir Direitos Humanos, porque determinadas pessoas têm mais direitos e outras não. Por que determinadas pessoas são mais respeitadas, podem continuar vivendo, e outras podem continuar sendo assassinadas aos milhares a cada ano por causa das suas orientações sexuais e identidades de gênero dissidentes?

Para finalizar: não tenho dúvidas de que os estudos da cultura e das humanidades (em sentido bem amplo, incluindo as subjetividades, a sociologia, a antropologia etc) são muito mais ricos em nos oferecer respostas sobre as nossas sexualidades, sejam elas dissidentes ou não, e de como devemos trabalhar para que todos e todas sejam respeitados e respeitadas.

E mais, a procura de uma resposta sobre a origem dos nossos desejos não pode jamais impedir o que mais importa: que todos possamos desejar de formas múltiplas, diversas, com o respeito que merecemos. (...)

Também de Leandro Colling, não deixe de ler "Desconstruindo as ideias do livro de cabeceira dos fundamentalistas religiosos", aqui.
Leia também: "Todo mundo é trans" (aqui) e "Criticando o sistema de gêneros" (aqui).

* * *

Rebatendo as críticas de que pretenderia reduzir uma suposta "explicação" da homossexualidade a causas genéticas, o próprio Eli Vieira postou ontem em seu perfil do Facebook:

Quem está dizendo que a genética é irrelevante para a questão da promoção da igualdade das pessoas independente de orientação sexual e identidade de gênero TEM RAZÃO.

O que fiz foi proteger minha área de atuação profissional de uma calúnia pública proferida por um leigo.

Não é por acaso que pensadores tão grandes quanto David Hume e Immanuel Kant convergiram em separar o que são "questões de fato" do que são "questões de direito". Separar "é" de "deve ser". E eu estou falando apenas da primeira categoria.

Os colegas acadêmicos que me atacam apenas por ser geneticista estão presumindo demais. Saibam que somos aliados contra o obscurantismo teocrático que tolhe direitos e esmaga vidas.


Leia também: Malafaia e os que se deixam pautar por ele (aqui), Ainda a teologia da estupidez (aqui), Conselho Federal de Psicologia repudia declarações de Silas Malafaia (aqui) e Carta a Silas Malafaia: Pastor, me ajude! (aqui)
Assista ao vídeo em que a jurista Maria Berenice Dias responde à entrevista de Malafaia (aqui)

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